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Fraude, disse ela

A KPMG foi processada pela SEC, que acusa a empresa e quatro dos seus partners de fraude nas auditorias conduzidas às contas da Xerox entre 1997 e 2000. Há já quem antecipe uma repetição do escândalo Enron, que arrastou para o abismo a Andersen, mas a KPMG insiste na rectidão da sua postura - POR CRISTINA PEREIRA

Fraude Disse Ela© Artville»» A Securities and Exchange Comission (SEC) processou no dia 29 de Janeiro a KPMG LLP e quatro partners da empresa, na sequência das auditorias feitas às contas da Xerox entre 1997 e 2000. A acção instaurada pela SEC no tribunal de Nova Iorque acusa a KPMG e os partners em causa de fraude e exige medidas de coacção, a devolução de todos os "fees" e o pagamento de multas.

A SEC alega que a KPMG e os seus partners permitiram que a Xerox manipulasse as suas práticas contabilísticas para ocultar uma "lacuna" de três mil milhões de dólares entre os resultados operacionais reais e aqueles que foram declarados ao público investidor. Ainda segundo a SEC, ano após ano os réus convenceram falsamente o público de que as suas auditorias eram conduzidas em conformidade com normas de auditoria pertinentes e que os relatórios financeiros da Xerox representavam realisticamente a condição financeira da empresa e que obedeciam às normas GAAP.

"Os espectaculares distúrbios que acometeram a paisagem empresarial ao longo do último ano acentuam a enorme responsabilidade que os auditores têm no processo de declaração financeira", referiu Stephen M. Cutler, director de fiscalização da SEC."Nas suas auditorias à Xerox, a KPMG e os seus partners abdicaram dessa responsabilidade", acrescentou.

Os quatro partners acusados, todos eles técnicos oficiais de contas certificados, são: Michael A. Conway, 59 anos, membro do conselho de administração da KPMG e presidente do Conselho Fiscal e Financeiro da KPMG; Joseph T. Boyle, 59, managing partner do escritório de Nova Iorque da KPMG; Anthony P. Dolanski, 56, actual CFO do Internet Capital Group e que foi o partner principal na supervisão das auditorias à Xerox entre 1995 e 1997; e Ronald A. Safran, 49, partner principal nas auditorias à Xerox em 1998 e 1999, tendo depois sido substituído por Conway.

A SEC alega que a KPMG permitiu que a Xerox manipulasse as suas práticas contabilísticas para ocultar uma "lacuna" de três mil milhões de dólares nas suas contas

Xerox pagou multa e corrigiu contas

Segundo alega a SEC, as filiais da KPMG na Europa, Brasil, Canadá e Japão, bem como os auditores da KPMG na sede da Xerox, em Rochester, Nova Iorque, alertaram repetidamente os partners da KPMG sob acusação para as acções de manipulação da Xerox. Estes teriam dado pouca importância aos alertas e não pediram à Xerox que justificasse "as razões do afastamento de métodos históricos de contabilidade ou que estabelecesse a precisão das novas práticas manipuladoras", diz a Comissão em comunicado.

Em Abril de 2002, a SEC acusou a Xerox de fraude contabilística. Sem confirmar nem desmentir as acusações, a empresa chegou a acordo com a SEC para o pagamento de uma multa de dez milhões de dólares e anunciou que iria rever os seus resultados financeiros relativos ao período entre 1997 e 2000, além de ajustar os resultados anunciados para 2001.

Depois da investigação e exposição desta "conduta fraudulenta", a Xerox, empregando um novo auditor, emitiu uma declaração que corrigia as suas vendas de equipamentos em 6,1 mil milhões de dólares e os seus lucros antes de impostos em 1,9 mil milhões relativamente aos anos de 1997 a 2000. As alegações de fraude da SEC contra a KPMG e os seus partners referem-se a erros de contabilidade que inflacionaram as vendas de equipamentos em três mil milhões de dólares e as de lucros antes de impostos em 1,2 mil milhões no período 1997-2000.

A KPMG considera "extremamente infeliz que a SEC tenha optado por proceder a tal acção, desta vez contra uma empresa que tão claramente tomou medidas fortes e corajosas face a um cliente de auditoria"

A melhor defesa é o ataque

Mas se a Xerox pagou e calou, a KPMG resolveu tomar outra atitude e refuta as acusações da SEC. Não é para menos. Este processo é o primeiro caso de fraude movido pela SEC contra uma das "Big Five" da contabilidade desde o colapso da Enron, que deu origem à desagregação da Andersen. Razão pela qual, ainda antes da SEC instaurar o processo, no dia 29 de Janeiro, a KPMG tomou as suas medidas. Na semana anterior ao comunicado da SEC, já ciente da vigilância que o órgão de fiscalização mantinha sobre si, a KPMG elaborou uma declaração de várias páginas em que defendia energicamente o seu trabalho. Especificamente, a KPMG oferecia uma descrição detalhada dos eventos do caso Xerox à medida que se desenrolaram e argumentava que tomara a "atitude correcta" ao recusar-se a assinar as declarações financeiras da empresa relativas a 2000 à luz daquilo a que chamou uma "forte resistência do cliente".

A empresa reiterou aquela postura numa nova declaração no dia 30 de Janeiro, acrescentando que o caso não envolveu rendimentos fictícios nem fraude. A KPMG considera "extremamente infeliz que a SEC tenha optado por proceder a tal acção, desta vez contra uma empresa que tão claramente tomou medidas fortes e corajosas face a um cliente de auditoria". A empresa sublinhou ainda o facto de a ocorrência ter lugar num momento "em que o governo, a comunidade empresarial e a profissão contabilística estão a esforçar-se por atingir novos níveis de cooperação para ajudar a restaurar a confiança do investidor".

Afirmando que preferia "resolver esta questão sem o envolvimento do tribunal", a KPMG insistiu no "procedimento correcto" que manteve em relação à auditoria à Xerox. A empresa acrescenta ainda que "sustenta firmemente as suas auditorias às declarações financeiras da Xerox entre 1997 e 2000 e a integridade e independência dos profissionais que as conduziram".

É ainda cedo para dizer mas, caso a KPMG venha a sofrer a mesma sorte da Andersen, restarão apenas três grandes empresas de contabilidade para lidarem com as contas da vasta maioria das grandes empresas americanas.

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